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"Eu não quero morrer sozinho", afirma idoso da Casa dos Velhinhos

Atualizado: 14 de jan. de 2022



Nem sempre o tempo é um senhor tão bonito como diz a letra da canção. Enquanto pode, Benício dos Santos tentou entrar em um acordo com ele, com o tempo, mas a força dos anos, do tempo, a solidão e um câncer na boca o fizeram ceder e aceitar a proposta de uma sobrinha para que fosse morar na Casa dos Velhinhos, instituição que abriga idosos há mais de meio século.


"No começo, resisti. Mas hoje não saio mais daqui por nada porque não quero morrer só. Mais que isso, sei que vai chegar uma hora em que vou precisar de mais cuidados, que não vou poder fazer coisas simples como tomar um banho sozinho, e aqui eles nos tratam muito bem", declarou o idoso que no próximo dia 17 completa 80 anos.


"E vai ter bolo". Intervém a diretora administrativa do local e assistente social Rosângela Maria, que também participa da entrevista.


Agricultor e frentista quando mais jovem, Benício é um dos 52 idosos que vivem na instituição, capacidade máxima de moradores no local. Para viver na Casa dos Velhinhos, há critérios que são estabelecidos pelo abrigo, em conjunto com o Ministério Público Estadual (MPE) e com o Centro Especializado da Assistência Social (Creas), além de laudo médico, apontando patologias.



"A senhora viu minha bicicleta? Viu onde ele deixou minha bicicleta? Eu emprestei e ele não me devolveu". Enquanto o blog conversava com a diretora, surgiu um idoso na porta da sala, procurando por uma bicicleta que, provavelmente, é uma das lembranças perdidas e embaralhadas na mente dele, que hoje sofre com Alzheimer, doença que tem estado presente nos moradores da Casa dos Velhinhos.


"Temos uma média de 8 e 10 idosos com essa doença e essa é mais uma de nossas preocupações quanto ao dia a dia e convívio", explicou Rosângela Maria.


Salário dos idosos ajuda a manter abrigo


Sem apoio do poder público municipal e estadual - durante a pandemia, o governo federal recursos financeiros para compra de kits nutricionais -, a Casa dos Velhinhos sobrevive de 70% dos salários dos idosos e doações da sociedade. Antes da pandemia, os associados passavam dos 130, número que caiu quase pela metade durante o período mais crítico da Covid-19.


Segundo Rosângela Maria, cada idoso custa, por mês, em torno de R$ 2 mil, o que da um gasto fixo e mensal de mais de R$ 100 mil. Com os 70% da aposentadoria dos idosos, a Casa dos Velhinhos compra alimentos, alguns, remédios, paga energia elétrica e equipe de apoio formada por profissionais fisiorapeutas e psicólogos que lidam o dia a dia com o público do abrigo.


Há também custos com os trabalhadores da cozinha e serviços gerais. Por dia, inclusive, são servidas cinco refeições: café da manhã, almoço, lanche, jantar e ceia.


"Os 30% das aposentadorias dos idosos são utilizados por eles em necessidades pessoais como a consulta de vista e compra de óculos, por exemplo, ou um relógio, para os que gostam. Enfim, fica a critério deles e das suas famílias", explica a diretora.


Pandemia fez crescer busca por vagas


Também com a pandemia, de acordo com Rosangela, a procura por vaga na instituição cresceu assustadoramente.


"Hoje, por dia, a gente recebe pelo menos seis ligações ou visitas de famílias querendo colocar os seus idosos aqui na Casa dos Velhinhos. E não temos mais condição de abrigar nenhum deles", revelou a diretora da instituição que, antes de assumir o cargo, trabalhou por lá como voluntária atuando como assistente social.


"Costumo dizer que as coisas estão mais ou menos escritas em nossas vidas. Apesar de meu pai não ter vindo morar aqui na instituição, quando ele adoeceu eu vim fazer uma espécie de treinamento de como cuidar, em casas, de escaras. Fui ficando, virei voluntária e tenho a impressão que não saio mais daqui".


Mas nem sempre cuidado e dedicação que Rosângela Maria teve com o pai até o fim da vida dele, por exemplo, é o mesmo que outras famílias dão aos seus idosos. Os casos de abandono total de homens e mulheres já no fim de suas vidas não é maioria na instituição, mas eles acontecem.


"Há casos em que as famílias trazem seus parentes porque alegam falta de paciência de lidar com os idosos, falta de tempo e habilidade para o dia a dia e recurso financeiro para contratar, por exemplo, cuidadores, já que são necessários dois para se revezarem nos turnos. Mas há as situações que a família simplesmente não quer conviver com o pai, a mãe, um tio que já não pode mais consigo e os abandonam. É uma realidade", revela a diretora.


Nesse cenário, conta a diretora, os idosos reclamam a ausência dos familiares que não aparecem, se entristecem, mas os voluntários e funcionários procuram dar carinho e atenção a todos eles no intuito de amenizar a dor do afastamento dos parentes.


"Seu Benício foge um pouco a esse contexto porque em datas agora como o Natal, ele vai para casa da irmã e da sobrinha dele. Mas é um caso que posso dizer não tão comum. Porém, de tudo isso, os que podem se expressar sempre nos dizem que, apesar de tudo, a alegria de estarem vivos é maior", finaliza Rosângela Maria

 
 
 

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